terça-feira, 20 de setembro de 2011

Patrimônios da cidade do Rio de Janeiro II

Automóvel Club do Brasil


Crédito: Ascom Sonia Rabello
Quem é responsável pelo descaso com o patrimônio cultural da Cidade?

Se ele cai, é deixado deteriorado, ou é destruído – a quem cobrar?

A lei federal nº 9605 de 1998, que dispõe sobre crimes contra o meio ambiente, o ordenamento urbano e o patrimônio cultural diz, em seu art.62, o seguinte:

“Art.62: Destruir, inutilizar ou deteriorar:

I – bem especialmente protegido por lei, ato administrativo, ou decisão judicial.
(...)

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Parágrafo único: Se o crime for culposo, a pena é de 6 (seis)  meses a 1 (um) ano de detenção, sem prejuízo da multa.”

No caso do prédio do Automóvel Club, situado à Rua do Passeio nº 90, no Centro do Rio, haveria, no mínimo duas autoridades – o Estado e o Município do Rio.  Isto porque o prédio é tombado (1985) pelo INEPAC (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural), e atualmente pertence ao Município do Rio de Janeiro (Aquisição pelo Município do Rio de Janeiro por Carta de Arrematação expedida pela 7ª V.F.P., matrícula nº 32917, ato R-51, do 7º RGI).

Decadência e abandono

Tombado pelo INEPAC em 1965, o imóvel foi ocupado pelo Bingo Imperial até 2003, antes de fechar definitivamente as portas e cair no abandono e na decadência: à noite a pequena escadaria do imóvel serve de "cama" para moradores de rua, ou mesmo de banheiro para os frequentadores da região.

Tempos de glória

Crédito: Reprodução Internet

Totalmente pichado, comprometido por rachaduras e infiltrações, e ameaçado de desabar, o imóvel é uma pálida lembrança daquele projetado por Manuel de Araújo Porto Alegre para ser a residência dos Barões e Viscondes de Barbacena (Oliveira Horta Caldeira Brandt).

Depois disso, foi adquirido, em meados do século XIX, pelo Cassino Fluminense, quando os clubes dançantes estavam na moda. Ganhou destaque por ser frequentado pela alta sociedade e pela Família Imperial.

Em 1854, foi reformado pelo arquiteto Luís Hoske, que o transformou num prédio de dois pavimentos com linhas neoclássicas e interior luxuoso, no qual se destacava o salão de baile. Em 1900, lá se instalou o Clube dos Diários.

Em 1910, foi reformado segundo projeto do famoso arquiteto francês Joseph Gire. 

Em 1924 passou a sediar o Automóvel Club do Brasil e, em 1964, foi palco do último discurso do presidente João Goulart antes do golpe militar. 

Importância histórica, e identidade com a Cidade o prédio tem. Mas descaso pelas autoridades também.

Crédito: Ascom Sonia Rabello
Em 2005 a Prefeitura pretendeu instalar ali uma biblioteca municipal central, o que seria bem vindo, já que não temos nenhuma deste tipo, e as bibliotecas municipais estão em extinção, mas o projeto não foi adiante.

Em 2008, a prefeitura lançou um edital para a ocupação do imóvel por um club de jazz – com biblioteca virtual, bar com ambientes de época e um espaço de memória. Teria sido muito bom. 

A proposta vencedora, entre as sete apresentadas, previu um investimento de R$ 28 milhões na recuperação do imóvel, a ser reinaugurado em 2009 (custo anunciado da “aranha” que puseram no Parque do Flamengo) Termo de Cessão de Uso nº 12/2008-F/SPA, em vigor, lavrado entre o Município do Rio de Janeiro e o Instituto Cultural Brasilis.

Porém, nada foi adiante, e não conseguimos apurar por quê !

Aliás, como vereadora, e presidente da Comissão Especial de Patrimônio, solicitamos autorização para que a nossa equipe entre no prédio para uma vistoria, e recebemos o retorno que somente o Secretário Municipal de Cultura poderia autorizar a entrada.   Isto há dois meses!  Tudo bloqueado ao acesso e à informação. 


Crédito: Ascom Sonia Rabello
A antiga sede do Automóvel Club do Brasil permanece em total estado de abandono com seu belo frontão neoclássico lembrando, melancolicamente, o quanto ainda há a ser feito em uma cidade de mais quatro séculos, mas que pouco quer saber de sua história, mas ainda quer se candidatar a Patrimônio Cultural, pela UNESCO

E isto quando, ao reformar pela terceira vez o Maracanã, estima que o custo desta obra custe, aos cofres públicos, cerca de R$ 700 milhões.

Dinheiro tem.  Não tem é gestão, e nem priorização!

E aí? Voltando à pergunta inicial.  Sabemos que dinheiro tem, tanto no Estado, quanto no Município, que é dono do prédio – (vimos em post anterior que 30 milhões foram gastos por ambos, Estado e Município, para o pré-sorteio da Copa, pela FIFA, em algumas horas de evento, ocorrido em julho).

Crédito: Ascom Sonia Rabello
Pela lei, destruir patrimônio cultural é crime, e poderia gerar não só responsabilidade civil, como administrativa e, consequentemente, até política. 

Cabe ao Estado, que exerce a tutela deste bem cultural, e exigir do Município as obras de recuperação deste bem tombado.  Ele assim o exige quando o bem é do particular.  Por que não do Poder Público, que deve ser mais zeloso do que o particular ?

Então, por que não aplicar a lei?  No caso de se enquadrar a hipótese como crime contra o patrimônio cultural da Cidade, cabe ao Ministério Público  não só promover a ação penal, como também a ação civil pública, para apurar as responsabilidades!

Portanto, lei há, responsabilidade também.  Falta a consequente aplicação e punição, sem o quê, tudo vira mero discurso.

Veja mais do frontão do prédio aqui.

Um comentário:

Anônimo disse...

Entrei no prédio do Automóvel Clube há mais de 5 anos, quando fazia uma pesquisa sobre o local, e sabe o que encontrei? Destruição, por todos os lados, destruição. Nada mais resta de seus tempos de glória como salão de baile do Império ou mais tarde como cassino. Depois de ter sido devastado pelo Bingo, o pouco que restou foi arrasado em sucessivas invasões por moradores de rua. Esculturas, espelhos, ornatos, arte em ferro, a bela cúpula, tudo acabado. Mas ainda assim mereceria um restauro nas fachadas e quem sabe um uso digno de sua história. Ouvi que seria uma casa de samba, mas, francamente... Já temos Cidade do Samba, Passarela do Samba, Clube do Samba...
A ideia do clube de jazz me pareceu mais promissora, ou então, porque nao trazer o Museu da Cidade, esquecido lé na Gávea, para o Centro?
Jane