sexta-feira, 29 de julho de 2011

Maracanã: impasse entre torcedores e autoridades

O que se sabe, afinal, sobre a imensa reforma do Maracanã, para a Copa de 2014?



Sabe-se que ele está sendo parcialmente demolido, para sua reconstrução em um “estilo” FIFA, e para cumprimento das exigências desta entidade internacional. A “reforma” está orçada, até o momento, em quase R$ 1 bilhão.

Além disso, sabe-se que o Superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) no Rio deu autorização para a demolição do famoso estádio tombado, por entender, pessoalmente, que seu “tombamento etnográfico” não estaria protegendo, necessariamente, sua arquitetura, mas sim sua funcionalidade, como arena esportiva.

Ontem, dia 28 de julho, em audiência pública, realizada no auditório do Ministério Público Federal no Rio, soube-se um pouco mais.

Soube-se que:

- A Frente Nacional dos Torcedores sofre com a proposta de reforma do estádio, cujo projeto desconhece;

- Os torcedores querem um estádio que retrate o jeito “Maraca de torcer”, aberto, sem coberturas ao sol e à lua, sem espaços privilegiados, sem cara de “estádio shopping center”;

 - Pelo dizeres privilegiados do professor Carlos Lessa, o Maracanã é uma relíquia. Como tal deve ser preservado, até porque está tombado;

- Segundo uma torcedora, e também professora, apaixonada pelo Maracanã,a exemplo das reformas de escolas nas quais os professores devem ser consultados, pois são eles que sabem sobre a funcionalidade das mesmas, na reforma dos estádios a consulta aos torcedores é imprescindível, pois sem eles, o estádio não tem alma, nem sentido.

Os torcedores estão inconformados, pois estão afastados deste processo de consulta, e decisão sobre o futuro do “Maraca”, “templo da vibração”, “espaço do povo”.

O engenheiro responsável por sua “reforma”, Dr. Ícaro Moreno, justificou a drástica intervenção porque:

1. O estádio estaria estruturalmente comprometido, fato este surpreendentemente desconhecido, já que em 2007 foi feito uma reforma no mesmo para o PAN, onde engenheiros e firmas de Engenharia fizeram avaliação e obras no estádio. Como não viram nada, então?

2. Está “intimado” a entregar a chave do mesmo em dezembro de 2012 à FIFA, para a Copa das Confederações. Não fosse este prazo, e se tivesse mais tempo, sugeriu que, talvez, a “reforma” pudesse ser pensada mais detidamente, com maiores consultas!

Na audiência houve surpreendentes depoimentos dos professores de Engenharia, que detectaram o “falecimento” das estruturas do estádio. O “Maraca” estava doente e ninguém sabia?

Precisamos então ressuscitar o Estádio do Povo. Se ele é uma “relíquia” do futebol brasileiro, símbolo maior do nosso esporte predileto, a questão chave que se coloca é como fazer o que é preciso.

A pergunta chave foi feita por Cristopher, na audiência: a proposta “reforma” do “Maraca” é a compatível com o seu valor etnográfico? Com a preservação da imagem-símbolo que está gravada na alma dos torcedores, e no coração do Brasil? Ou devemos “evoluir” para um novo jeito FIFA de ser, e de torcer?

Pelo jeito, os torcedores, alma do “Maraca”, pensam que não. Eles querem o seu “Maraca” de volta!
Maracanã - 1950

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Aterro/Parque do Flamengo

Hoje no Parque:

A desfiguração do Parque tombado pelo evento da FIFA é rápida, suntuosa e de "entrega" internacional; ou seja, destituída de brasilidade e de simplicidade, num mundo necessitado de recursos e dinheiro.


Técnicos preparam a Marina da Glória para
o sorteio das Eliminatórias da Copa de 2014 - Fonte: R7
Em notícia publicada em um jornal paulista é afirmado que "a estrutura é maior do que a de congressos da Fifa em Zurique, feitos em pavilhão similar ao Riocentro. Nem a cerimônia de anúncio das sedes das Copas de 2018 e 2022, no ano passado, atingiu tal patamar." (confira)

Tudo isto em completo descaso e desprezo pela história de criação deste fantástico Parque público, que continuamos a contar abaixo. 

Imagino que, a esta altura, as autoridades do IPHAN e do seu Conselho Consultivo já não consigam dormir, em face das suas responsabilidades (...).



Um Central Park tropical III

Dois importantes colaboradores e o rompimento de uma grande amizade
 
Lota despachava num barracão de obras provisório junto a Área de Piquenique original. O local era desconfortável e ficava em meio ao ermo do parque ainda em construção.

Foi ali que Lota recebeu uma nova colaboradora: Ethel Bauzer Medeiros, que lhe fora indicada por um órgão internacional de recreação. A princípio reticente, Ethel logo se deixou cativar “pelo gesto de Lota, pioneiro no país: chamar um educador desde o início do planejamento de um parque.”

Lota não tencionava construir um parque convencional “com chafariz, bancos, estátua e brinquedinhos para crianças”. Idealizava um espaço que contribuísse para a melhoria da qualidade de vida de seus frequentadores. Resulta daí que os playgrounds deveriam ser pensados como lugares de educação continuada. (Hoje, a área destinada ao bosque de pic-nic foi destruído pelo "dono" da pedaço do Parque, chamado de Marina da Glória).

Ethel propôs espaços específicos para os bebês, crianças, adolescentes e idosos, com um número significativo de áreas livres que proporcionassem a todos a sensação de não estarem em meio ao trânsito de automóveis.

Com a inclusão de Ethel no Grupo de Trabalho, surgiram as primeiras dissidências. Roberto Burle Marx abespinhou-se com o fato de Ethel ser a responsável pelos playgrounds. Jorge Moreira aderiu à dissidência e ficou um bom tempo estremecido com Lota, que não deu muito importância ao fato, pois tinha outras prioridades em que pensar.


Dentre elas uma crucial: conseguir o tombamento do parque pelo Patrimônio. Embora ainda não concluído, mas apenas projetado, Lota via nesse instrumento jurídico a única salvaguarda da área contra a sanha da especulação imobiliária. Com esse fim, encaminhou pedido formal ao diretor de Patrimônio, Rodrigo Melo Franco de Andrade.

A segunda prioridade consistia em cuidar do projeto de iluminação do parque. O profissional escolhido para realizá-lo foi o americano Richard Kelly, que se apaixonou pelo parque e para ele concebeu “um sistema que iluminasse como uma noite de luar intenso”. Os meios para se chegar a esse fim: “apenas cento e doze postes de quarenta e cinco metros, suportando uma armação com seis projetores substituiriam os mil oitocentos postes previstos”.

Se “nada no aterro seria banal”, Lota de Macedo Soares teria, como sempre, de se proteger e enfrentar a artilharia pesada vinda de todos os lados: a indústria nacional não podia responder às exigências dos postes e complementos concebidos por Richard Kelly. Mas Lota os defendeu de unhas e dentes, usando argumentos técnicos – o Brasil não dispunha de especialistas em luminotécnica - e estéticos – a iluminação tinha um sentido plástico.

Matou mais esse leão. Faltavam muitos outros de diversas ordens. Mas, das cargas, talvez a mais pesada de segurar e ser absorvida foi a campanha de difamação promovida por Roberto Burle Marx.

Desde a contratação de Ethel Bauzer Medeiros, seguida do projeto de iluminação de Richard Kelly, que ele chamava de Abajurlândia, Burle Marx partia para duras ofensas pessoais referindo-se à Lota como pequena ditadora ou Joana D’Arc do Aterro.

Essa artilharia, talvez fosse uma resposta às decisões tomadas por Lota em prol da economia de recursos públicos, ao aconselhar a Sursan que procurasse outras empresas para fornecer grama para o Parque, que não a de Burle Marx, pelo fato de esta propor preços astronômicos por m².

Em carta enviada ao jornal O Globo, em resposta às críticas assestadas por Burle Marx, Lota arrematava: “Essa ‘prepotência’[a ela atribuída por Burle Marx] deu ao Estado uma economia de mais de cem milhões de cruzeiros, o que naturalmente mudou a opinião que tinha o Sr. Roberto Burle Marx do meu temperamento, antes tão apreciado.”

Razões de Estado e Razões do Afeto entrelaçadas começavam a minar a saúde de ferro da miúda e franzina criatura, toda nervos, toda luz. O Parque do Flamengo, aos trancos e barrancos se tornava uma realidade, como também era real que tirava de Lota de Macedo Soares as energias necessárias para ficar de pé.

*Todas as citações entre parênteses constantes deste texto foram extraídas de: Oliveira, Carmen L. "Flores raras e banalíssimas: a história de Lota de Macedo Soares e Elizabeth Bishop". Rio de Janeiro, Rocco 1995.


No próximo bloco: Do entulho surge um imenso parque

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Aterro do Flamengo

Enquanto isto, não deixem de ver o asfaltamento feito na Marina da Glória, para o sorteio da Copa, e as estruturas fechadas e escuras do "grande" evento ao custo de R$ 30 milhões, por algumas horas; valor que se equipara à totalidade das obras do PAC da comunidade do Cantagalo ! Sem contar com o custo do fechamento do Aeroporto Santos Dumont por 4 horas (?). Isto que é lugar adequado ! (confira) Por que as televisões não pagaram por este custo?


Um Central Park tropical II

Lota e sua equipe tentam o inimaginável: planejar*

Lota de Macedo Soares não tinha diploma, mas reuniu uma comissão de colaboradores diplomados para ninguém botar defeito. A adesão dos convocados não foi de pronto. Todos tinham, mesmo que vaga, a dimensão da complexidade do empreendimento.

O sonho de Lota era de grandes proporções físicas e implicava esforços materiais e intelectuais de igual monta, além de ter de enfrentar a resistência compacta e obstinada daqueles que ela passou a denominar de “sursânicos”, os técnicos da Sursan que plantavam uma pedra diante de cada passo que ela ameaçava dar.

Quando se fala na construção do Aterro do Flamengo, o nome mais comumente lembrado é o Affonso Eduardo Reidy. Sim, Reidy fez verdadeiramente parte da equipe pilotada por Lota, que o convocou como urbanista, não só por sua expertise no métier, mas também por sua experiência de trinta anos como funcionário da Prefeitura do Rio.

Roberto Burle Marx, grande amigo de Lota, foi indicado para se encarregar do paisagismo, Alexandre Wollner da programação visual, e Jorge Moreira e Sérgio Bernardes da arquitetura.

Reidy e Sérgio Moreira relutaram em abraçar o projeto e só o fizeram em razão da amizade que nutriam por Lota.

A batalha de Lota e sua comissão constitui um capítulo importante da História da Mentalidade Administrativa no Brasil, que ainda está para ser formalmente escrita, mas que reúne exemplos suficientes para constituir uma enciclopédia.

Se não vejamos: após analisarem a viabilidade de conclusão do projeto em quatro anos, Lota e sua comissão concluíram que ela seria possível, mas muito trabalhosa.

É o que se pode constatar num trecho de seu relato sobre as primeiras pedras no caminho:

“(...) empacamos no problema da área usável para os jardins. Pensamos em duas pistas para carros. Mas a Sursan defende com unhas e dentes que o Aterro seja ocupado pro quatro pistas. (...)

Desde 1954 que a Sursan deveria ter mandado fazer o estudo da orla do mar. Por que não mandou até hoje? Mistério. Diz a Sursan: Vocês façam toda a planta do Aterro, com praias, restaurantes à beira-mar, etc. e aí mandaremos fazer o estudo. Bolas isso é querer que se façam duas plantas, já que o estudo hidráulico é que dirá se a praia que nós vamos indicar no projeto será ou não naturalmente formada pelo mar, ou se será artificialmente ajudada. A cada terça-feira surge uma informação diferente.”

Sucederam-se muitas terças-feiras, até que Lota chegou à conclusão que, para manter as rédeas nas mãos, teria de transformar a Comissão em Grupo de Trabalho ao qual ficaria atribuída a tarefa de tomar as decisões relativas à parte aterrada e à orla marítima. À Sursan caberia apenas executar o determinado pelo Grupo.

O Grupo foi criado, por meio do Decreto 607, publicado no Diário Oficial, em 04/10/1961, que incluía todas as prerrogativas estabelecidas por Lota.Mesmo assim, quinze dias depois, "O Globo" publicava uma declaração de Gilberto Morand Paixão, engenheiro-chefe do 12º distrito de obras da Sursan, em que este tornava claro o nebuloso: dizia que a destinação das áreas do Aterro ainda era indefinida e o que de certo havia era a construção de quatro pistas para veículos...

Indignada, Lota apelou para o vice-governador e, finalmente, conseguiu reverter o processo, fazendo com que se aprovassem as duas pistas, e não as quatro.

A essa altura, sua vida já estava tragada pelo inferno kafkiano dos jogos políticos e das intrigas de gabinete, que ela absolutamente não dominava. Em prol de seu sonho disparava cartas em todas as direções batendo-se, inclusive por causas não diretamente relacionadas à construção do Aterro.

Assim, não deixou de torpedear Carlos Lacerda contra construção de um hotel internacional no morro do Pasmado. Como bem salienta Carmem L. Oliveira, o governador conhecia claramente como Lota pensava os elementos da paisagem como patrimônio dos cidadãos.

Mas, por outro lado, um investimento internacional significava a entrada de milhões dólares para o Estado. (os mesmos argumentos de hoje em dia, e sempre...).

Ao longo da correspondência entre Lota e seu amigo agora governador, assistem-se os embates entre a Razão Prática e a Razão Utópica. No caso da construção do hotel no morro do Pasmado, Lota fala de barbarismo, estupidez e crime e lembra ao amigo “que não era democrático destruir o patrimônio de todos para aliviar a sorte de alguns.”

E em defesa do conjunto do Hotel Glória, vituperou: “Não cometa a estupidez de entregar ao Hotel Glória os estacionamentos previstos para servirem de jardim!”  (Será que esta ameaça se concretizou 50 anos depois???)
Por vezes, o embate era aquele de racionalidades diferentes, como foi o caso da discussão entre os dois, presenciada por um estupefato ajudante de ordens, sobre o melhor e mais econômico revestimento para os jardins do Aterro.

Lacerda era a favor do saibro, que, do ponto de vista de Lota, seria destruído na primeira chuva. Para ela, a grama era mais barata e durável.

Diante da teimosia do governador e amigo, Lota não teve papas na língua:

- Carlos, deixa de ser idiota, Carlos!

 

*Todas as citações entre parênteses constantes deste texto foram extraídas de: Oliveira, Carmen L. "Flores raras e banalíssimas: a história de Lota de Macedo Soares e Elizabeth Bishop". Rio de Janeiro, Rocco 1995.


No próximo bloco:

Dois importantes colaboradores e o rompimento de uma grande amizade.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Aterro do Flamengo


Às vésperas de parte do Parque do Flamengo - o pedaço da Marina da Glória -ser tomado por seu novo "dono", o Sr. E.Batista, com suas tendas gigantescas a festejar, num evento que custará R$ 30 milhões aos cofres públicos do Rio de Janeiro, o sorteio das eliminatórias da Copa de 2014, resolvemos contar, em quatro partes, a história da criação do Parque, para sabermos o que estamos prestes a destruir, privatizando este inigualável espaço público (...).

Um Central Park tropical I : Uma profecia*

"Aquela miúda e franzina criatura, toda nervos, toda luz que se chamava Dona Lota". Carlos Lacerda

Quem vem e vai pelo Aterro do Flamengo não supõe o que ele custou. Pode calcular o que tenha custado em cifras, mas, se esse sujeito que por lá transita nasceu nos anos 70, terá uma ideia defasada dessas cifras em relação ao que elas tornaram possível: de um entulho que era a continuação do Aterro da Glória foi feito um parque a perder de vista que constitui uma das mais belas paisagens da cidade do Rio de Janeiro.

Paisagem natural e urbana, patrimônio tombado pelo IPHAN, local de lazer de milhares de cariocas e espaço de repouso do olhar de tantos outros.

Lota de Macedo
Mas o Aterro do Flamengo não se avalia apenas por números, mas, sobretudo, pela tenacidade enérgica e inesgotável de uma mulher morena, miúda, inteligentíssima e solar que se chamava Lota de Macedo Soares.

Seu pai, José Eduardo Macedo Soares, além de jornalista, envolveu-se muito com a política e foi exilado durante o governo de Artur Bernardes. Esse exílio contribuiu para fazer dela uma cidadã do mundo: tornou-se poliglota, culta, profunda conhecedora das artes e uma apaixonada pelo urbanismo, termo e prática palidamente conhecidos no Brasil de então.

Lota era amiga e vizinha de Carlos Lacerda na serra de Petrópolis, onde ambos tinham sítios. Varavam tardes e noites em longas conversas sobre os mais variados assuntos. A interlocução entre eles era fluida e fecunda.

Assim, foi inevitável que, quando empossado primeiro governador da Guanabara, Lacerda quisesse, de alguma maneira, ter Lota como sua colaboradora.

É Carmen L. Oliveira – biógrafa de Lota, a cuja obra Flores Raras e Banalíssimas recorreremos sempre para, nessa série de relatos, comentarmos alguns aspectos relevantes da aventura da construção do Aterro do Flamengo – quem nos relata em que circunstância Lota foi definitivamente capturada para empreender essa obra que mudou o perfil da orla carioca, que se estende desde a Avenida Beira Mar até a Praia de Botafogo.

Em 5 de dezembro de 1960, Lacerda comemorava sua vitória na campanha eleitoral em seu apartamento na Praia do Flamengo. Lota era, naturalmente, uma das convidadas.

O recém empossado governador aproximou-se da amiga e, mais uma vez, insistiu: precisava dela como colaboradora do que quer que fosse. Lota continuava relutando, argumentando não possuir um diploma de curso superior. O governador não se convencia e, então, vencida, Lota apontou para um entulho exatamente em frente ao apartamento do governador. Era a continuação do aterro da Glória. – Dê-me este aterro. Vou fazer ali um Central Park.”


Aterro do Flamengo - Início da década de 60.

Sem diploma universitário, e pensando que não seria adequado ganhar salário, por pertencer a uma família abastada, Lota de Macedo Soares foi nomeada, em 20 de janeiro de 1961, sem ônus para o Estado, como assessora especial do Departamento de Parques da Secretaria de Geral de Viação e Obras e da Superintendência de Urbanização e Saneamento (Sursan) “para estudar a urbanização das áreas decorrentes do aterro do Flamengo e Botafogo”.

Na Sursan (Superintendência de urbanização e saneamento), guarda-chuva de engenheiros e arquitetos, Lota de Macedo Soares era vista com desconfiança. Ela seria, no máximo, “uma coadjuvante” do governador, sem qualificação técnica para opinar num projeto do porte como o do Aterro.

Lota não possuía diploma universitário e não precisava ganhar dinheiro, este passou a ser o bordão incansável de seus detratores.

Eles não perdiam por esperar. Entendendo que “o aterro era dela”, Lota quis imediatamente tomar pé do andamento das obras. Examinou detalhadamente o PA-7175, projeto aprovado onde constavam informações sobre as obras do Aterro já iniciadas de entrocamento, pistas, passagens de pedestres e sobre a situação dos clubes náuticos.

Dominando o conhecimento da situação, Lota escreveu a Carlos Lacerda, em 20 de fevereiro de 1961, fazendo uma profecia:

“A área do aterro pede especial cuidado no sentido de se conservar a sua privilegiada paisagem e a brisa marítima, e de se transformar um simples corredor para automóveis numa imensa área arborizada, que será dentro em breve um marco da cidade, tão famoso quanto são o Pão de Açúcar e as calçadas de Copacabana.”


Tendas para o Preliminary Draw, dia 30/07, na Marina da Glória

**Todas as citações entre parênteses constantes deste texto foram extraídas de: Oliveira, Carmen L. "Flores raras e banalíssimas: a história de Lota de Macedo Soares e Elizabeth Bishop". Rio de Janeiro, Rocco 1995.


No próximo bloco: Lota e sua comissão tentam o inimaginável: planejar

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Copa: “STAR” ou não estar no Bairro Peixoto?

"Isonomia quer dizer que, todos são iguais não só perante a lei, e como também na lei"

Somos um Gabinete urbanisticamente curioso. Após notícia, em jornal de grande circulação (confira aqui), sobre a implantação de uma nova unidade hospitalar em uma área de proteção ambiental (APA do Bairro Peixoto), em Copacabana, na Zona Sul do Rio de Janeiro, fomos pesquisar as possíveis implicações do empreendimento na área.

Trata-se de empreendimento a ser construído em um terreno desocupado pela Light, remanescente das obras de modernização da Subestação Elétrica no bairro. A nova subestação, que ocupa apenas uma fatia do antigo terreno, liberou uma grande área para ser negociada pela Light.

Não conseguimos descobrir se o processo de desmembramento do terreno, que tem frente tanto para a Rua Joseph Bloch, quanto para a Rua Figueiredo de Magalhães, foi concluído. Somente com o terreno desmembrado, a área liberada poderia ser vendida para uma outra construção com outro uso.

O suposto novo terreno – promessa de expansão hospitalar – encontra-se dentro da APA (Área de Proteção Ambiental) do Bairro Peixoto, o que a submete às regras da mesma, ou seja, altura máxima de 15 metros (confira aqui ). 

O projeto da unidade hospitalar, já em exposição no site da empresa RAF Arquitetura, apresenta 8 pavimentos. Este número de pavimentos elevaria a altura da edificação a um mínimo de 24 metros – não contando cobertura. Ou seja, extrapolaria os limites estabelecidos pela APA do Bairro Peixoto.
Para realizar tamanha empreitada contra as regras de preservação da APA, os donos da rede de hospitais ainda terão que fazer aprovar na Câmara dos Vereadores uma lei especial só para eles (confira o PLC 55), lei esta que excetuaria para estes privilegiados um gabarito maior para edificar no bairro de todos.

Mesmo que conseguissem tal empreitada, o que acredito ser muito difícil, ainda assim tal lei seria inconstitucional, pois no sistema jurídico brasileiro há um mandamento constitucional que diz que não só as pessoas são iguais perante a lei como também na lei.

Esta é a garantia de igualdade de tratamento de todos pela lei. Este é o sentido de Democracia. Esta sim, ao que parece, ainda em fase de construção.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

CIDADE NOVA: sua população será expulsa?


A Cidade Nova, bairro do Centro do Rio de Janeiro que abriga um dos mais resistentes grupos de cidadãos cariocas, tem uma localização estratégica, pois está a meio caminho da Tijuca e do Centro, sendo servido por duas estações de metrô (Praça Onze e Estácio). Além disso, está próximo a algumas das principais vias da cidade (Presidente Vargas, Perimetral, Rebouças, Santa Bárbara).  Foi uma área que restou, após a construção da Avenida Presidente Vargas.

Nosso gabinete recebeu, no dia 12 de julho, moradores e dirigentes da Associação de Moradores da Cidade Nova para tratar dos problemas da região. Isto porque, subitamente, com a implosão da antiga fábrica da cerveja da região, a área voltou a ser do interesse imobiliário/comercial, já que prédios novos e "inteligentes" estão sendo programados para o local.

Segue relato dos moradores sobre os problemas que têm vivido:

“Com a instalação de UPPs no Morro do São Carlos e o anúncio de novos investimentos públicos e privados, o interesse pelos terrenos na região se revigorou. Isso tem gerado insegurança nos moradores, pois estão se sentindo cercados pelos oportunistas que têm aparecido e invadido os imóveis em busca de indenização ou alguma outra vantagem oferecida pela Prefeitura, que deseja reurbanizar a área.

Com isso, surgiu uma verdadeiro mercado negro, pois os imóveis da região, em geral, estão abandonados pelos antigos donos. É uma área há muito esquecida pelo poder público, e que agora está se valorizando (diga-se, inflacionando), aumentando o preço dos terrenos e, com isso, o aluguel devido pelos moradores, dentre eles, alguns lá residem há mais de 30, 40 anos.”

Alguns moradores não podem nem deixar sua residência, sob ameaça de nova invasão de oportunistas.  Outros recebem "ordem" de despejo por parte do poder público, com eventual oferta de moradia, bem longe, na zona oeste.

Enquanto isto, o conjunto tombado da Rua Salvador de Sá está caindo aos pedaços, embora já tenha sido alvo de inúmeros projetos e intenções de restauração para moradia da população local. Tudo promessas e reportagens em jornais na base do "vou fazer", e "inauguramos o projeto".(confira).

Na área ainda há o prometido conjunto habitacional a ser construído (?) na região do antigo presídio da Frei Caneca, de propriedade do Estado (confira).  O Estado do Rio havia desistido deste projeto social e, pelo que dizem, voltou atrás.  Bom!  Mas onde está a ação efetiva?

Enquanto isto, gasta-se R$ 1 bilhão na re-reforma do Maracanã, destruído para ser reconstruído segundo a ordem do modelo-FIFA e, do outro lado da avenida (no Projeto do Porto do Rio, dito Maravilha), contrata-se a restauração de galpões ferroviários a serem ocupados por organizações sociais (privadas), ainda não definidas, e ao custo inicial de cerca de R$ 8 milhões !

Isto é planejamento urbano público social??? Como deter tamanho descaminho de dinheiro, e desconsideração com o problema habitacional da população carioca?

quinta-feira, 21 de julho de 2011

INHAÚMA: querendo voltar a ser um bairro, planejado!


Em minha visita ontem, dia 20 de julho, a Inhaúma, na Zona Norte do Rio, a convite dos moradores Simone e Paulo, tive a mais plena convicção da importância do planejamento urbano público na qualidade de vida da cidade.

Planejamento público é a concepção, ensinada nas escolas de Urbanismo e de Direito Urbanístico. Mas como função pública, como serviço público, o planejamento urbano, que se diferencia do direito de construir - que é uma faculdade privada do dono, ou do possuidor de uma parte do solo urbano -, ainda não está implantado na prática da Cidade do Rio.

O Rio pode ter aprovado um Plano Diretor, mas visitando Inhaúma vimos que o mesmo em nada afeta, positivamente, este ou qualquer bairro da cidade, senão para fixar gabaritos construtivos privados, e o zoneamento de uso urbano.

A impressão que tive, ao adentrar mais por aquele bairro esquecido em sua conservação urbana, é a de que a única função pública pensada há muitos anos para aquela região foi a de transporte coletivo.

Mas, ainda esta, foi pensada isoladamente, com o metrô rasgando o bairro ao meio, isolando a travessia com seus muros e áreas circundantes abandonadas; e a Linha Amarela atravessando o bairro em sua diagonal.

Muitas vias, muitos carros sem ter aonde pôr. São despejados nas calçadas do bairro... Será que as Trans farão o mesmos com os outros bairros pelos quais passarão ?

Por outro lado, com muitas indústrias que já saíram do bairro, e outras que ainda resistem (a Aladim e a Plus Vita), inúmeras áreas são deixadas vazias e são subaproveitadas. Por que então não ocupá-las com habitação acessível à classe média, que é a tradição da Zona Norte carioca?

Existe muita área abandonada, e outras que podem ser adensadas. Cabe ao planejamento urbano público tomar esta iniciativa. O planejamento urbano no Rio é tímido e descontínuo. O que ele propõe são situações e soluções pontuais, que nada resolvem.

E, o mais grave, é que ele é compreendido somente como estabelecimento de gabaritos mais altos para “estimular” o desenvolvimento do bairro. Inclusive, fala-se, oficialmente, que a medida do “desenvolvimento” de um bairro é o número de licenças novas de edificação concedidas, como se estivéssemos ainda no período colonial!


A inversão desta lógica de apropriação privada do plano urbano, que deve ser público, parece ser ainda o nó da questão: ou seja, se é que a cidade precisa crescer, o que deve ser respondido pelo planejamento urbana público é como ela deve crescer...

quarta-feira, 20 de julho de 2011

LEGISLADOR DE PLANTÃO: o que votar?

Neste recesso de sessões de votação da Câmara de Vereadores do Rio aproveitei para fazer um levantamento do meu dever de casa básico: saber o que há para votar, para não ser surpreendida com projeto de lei desconhecido, ou repentinamente colocado em pauta.

Surpresa: na pauta para ser votado há 129 projetos! Alguns em 1ª discussão e votação, e outros já em 2ª votação. É muito projeto de lei.

Afora estes projetos, há em tramitação pela Casa Parlamentar, esperando sua inclusão em pauta de votação, mais 1854 projetos, o que totaliza uma soma de 1983 projetos de lei circulando no site da Câmara, local onde se pode obter este tipo de informação. Entrarão todos em pauta para votação? Não sei.

Nossa sorte é a de que dos 129 projetos de lei em pauta para votação talvez 20% deles se refiram a conferência de títulos de cidadão honorário, a atribuição de nomes a logradouros públicos, e à inclusão de associações na categoria de utilidade pública.

Na votação destes projetos todos “ficam como estão”, em votação simbólica, e nunca se pede conferência nominal de votos. É tudo muito rápido, como num piscar de olhos. Nunca se acumulam, e formam um saldo legislativo de “eficiência” para os vereadores proponentes.

Pessoalmente penso que estas tipologias de projetos de lei, cujo conteúdo é especifico e individual não deveriam ser objeto deste tipo de deliberação legislativa – lei – cuja característica técnica é ser uma norma genérica e abstrata, ou seja, abranger um comportamento hipotético (abstrato), e não individualizado (generalidade). Isto é o que se aprende nas Escolas de Direito.

Mas, ao que parece, na prática a teoria é outra.

Na primeira vez que me opus a votar atribuição de nome a logradouro público, por proposta individual de vereador, houve uma forte reação dos colegas, com a argumentação de que esta era uma conquista política dos vereadores que, através dela, poderiam captar, nas suas comunidades, as homenagens que esta gostaria de prestar a alguém.

Votei contra, não ao nome, mas à ideia, pois, a meu ver, a proposição de um nome não teria qualquer controle ou parâmetro social, mas unicamente político. Perdi, sozinha, na votação. É que ninguém vota contra a proposta de um colega, até por conta do “código de reciprocidade”.

Porém, no meio deste quantitativo exorbitante de projetos de leis, há aqueles que mexem com o coração da cidade, com direitos dos cidadãos, com obrigações que estão sendo instituídas para todos. Por isto, é bom ficar de olho e participar!

Vamos estar alertas e comentando, na medida do possível!

terça-feira, 19 de julho de 2011

Balanço parlamentar do primeiro semestre legislativo

Em discurso durante os trabalhos de encerramento das atividades da Câmara Municipal, fiz um pronunciamento sobre meus primeiros cinco meses de atuação parlamentar, e que devo registrar aqui, com uma abordagem um pouco diferente; mais objetiva, talvez.

Primeiramente, devo dizer que compreendi totalmente o sentido da frase que diz que política é a “arte do possível”. Acrescentaria, quem sabe, dizendo que é a arte de tentar transformar o impossível em possível, o que é quase impossível.

E isto é especialmente verdadeiro hoje, no parlamento, já que este poder - o Legislativo - vive como uma sanguessuga do Executivo –; se abastece do “sangue” das pequenas benesses administrativas, e de obras que lhe são oferecidas, em troca de sua fidelidade de voto. Como mudar isto ? Só o eleitor pode, com seu voto, compreendendo o que isto significa, e não esperando do parlamentar aquilo que ele não pode, ou não deve dar, ou seja, favores que dependam do Executivo.

Na Câmara, não sou da chamada “base”, o que não significa que eu seja da oposição. Base versus oposição é um pensamento maniqueísta na política, que tende a ter o Governo Executivo como adversário de poder. Mas não considero esta a melhor posição parlamentar, pois fazer leis requer uma representação livre e compromissada com os seus eleitores, com o seu pensamento e os seus princípios, não importando se a proposta legislativa venha de quem vier, do governo ou de parlamentares, da situação de poder, ou não.

Neste semestre a Câmara votou importantes projetos de lei que interferirão em grandes gastos e na gestão urbana. Destacamos, dentre estes projetos, o que autorizou o subsídio de mais de 70% à concessão privada da construção da Transolímpica, e o que autorizou a concessão dos serviços de esgoto da Zona Oeste do Rio.

Em ambos os projetos votamos contra, porque os dois vieram ao Legislativo sem qualquer explicitação dos termos e limites das concessões solicitadas: nem valores, limites contratuais, ou formas de prestação dos serviços – nada, nenhuma explicação ou compromisso, só o pedido de autorização e pronto. Um cheque em branco para fazer como der e vier.

A chamada “base” parlamentar ficou atenta às nossas ponderações, mas, na hora “h” votou em bloco a favor das autorizações.

Neste semestre nossas propostas legislativas não se notabilizaram pela quantidade, mas pela qualidade: duas delas implicam no compromisso de gerar habitação social.

O primeiro, dispõe sobre a destinação de áreas e percentuais das receitas advindas dos Certificados de Potencial Adicional Construtivo (CEPACs) para fins de habitação de interesse social, na área portuária, bem como reserva de área no local para este mesmo fim: em ambos os casos, um mínimo de 10%. (Confira o projeto)

Também propus projeto de lei que garantisse a permanência da Câmara Municipal na atual sede, uma vez que o Projeto do Porto, embora contrariando a Lei Orgânica, prevê sua transferência para a área portuária. Aliás, a Área Portuária foi objeto de inúmeros pronunciamentos meus em Plenário, acentuando a questão da inexistência de projeto urbanístico para o local, e a forma de venda de todo o potencial construtivo da área, sem o devido cuidado e trato urbanístico para tal.

Os debates sobre assuntos que interessam aos legisladores também foram intensos ao longo do semestre, abordando questões ainda não resolvidas, como o uso da Marina da Glória, com a preservação da integridade do Parque do Flamengo que se vê na iminência de ser fatiado para ali se realizar uma privatização, bem como o projeto que introduz o ensino religioso na rede de ensino básico do Município, assim como as propostas de leis que tratam de planos urbanísticos dos bairros.

Dentre estes, propus emenda ao novo projeto de lei do PEU das Vargens, garantindo a sustentabilidade ambiental mínima da região, em face da densificação proposta para o local. (Confira o projeto de lei complementar e a emenda proposta)

Outros assuntos importantes, como indicações junto às associações de moradores e junto aos servidores municipais, estes últimos, seriamente ameaçados nos seus direitos previdenciários, devendo merecer um olhar cuidadoso por parte da Câmara Municipal: tanto o projeto de lei complementar nº 41 quanto o projeto de lei 1005, que trata da disponibilidade de bens do PreviRio e do FUNPREVI, podem ameaçar direitos dos servidores, bem como o patrimônio previdenciário amealhado para este fim.

Enfim, a atividade legislativa é intensa, e não é nada simples, pois não diz respeito somente aos próprios projetos, mas também ao cuidado em estudar o que o Executivo e os outros colegas propõem. 

Tudo isto requer tempo, estudo conhecimento e, sobretudo, a difícil arte de convencer e seduzir os demais para o seu ponto de vista, o que não é nada fácil só no gogó... 

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Planejamento urbano perdido: associações de moradores reagem

A cultura histórica do planejamento urbano não está do nosso lado, mas, mesmo assim...
 
Carmen L. Oliveira, em seu livro Flores Raras e Banalíssimas, conta-nos que, em 1963, Lota de Macedo Soares, presidente da comissão responsável pela construção do Parque do Flamengo, escreveu ao então governador Carlos Lacerda cobrando-lhe providências no sentido do estabelecimento de critérios claros, leia-se planejamento, em prol do parque e de sua futura preservação. A autora sugere que essas inúmeras advertências de Lota Macedo Soares ao governador o fizeram pensar que, além das obras específicas que empreendia – o túnel Santa Barbara, o plano habitacional, as novas adutoras e a rede de esgotos –, a cidade necessitava de um plano global.
 
Apesar das vozes de protesto, Lacerda contratou o grego Konstantinos Doxiades. Independente das restrições que se possa fazer ao Plano Doxiades, tratava-se de um plano urbanístico, instrumento que a cidade, até hoje, não possui. Quando o tem, como o Plano atual, aprovado em fevereiro de 2011, embora vago e genérico, suas diretrizes não são obedecidas: existem apenas para constar. Grandes vias estruturais são construídas e decisões sobre o Metrô são tomadas, sem qualquer preocupação em vinculá-las a um Plano de Transporte da Cidade. Ou melhor, não há nem Plano de Transporte Urbano, nem Plano Metropolitano!
 
Os Planos de Estruturação Urbana (PEU) de bairros, como o da Penha, que tramitam na Câmara de Vereadores, enviados antes mesmo do Plano Diretor (PD) ser aprovado, têm um conteúdo que não respeita as normas e diretrizes do PD e, mesmo assim, o Executivo não se preocupa nem em adaptá-lo, nem em revisá-lo. Aprovar as normas que densificam o bairro parece ser a única preocupação. Depois de aprovar as normas de densificação do bairro, ainda que estas contrariem o Plano Diretor, restaria o longo e sacrificado caminho da Justiça, como no caso do PEU das Vargens, agora questionado no Judiciário pelo Ministério Público. Parece que se conta com a inércia para que as coisas fiquem como sempre estiveram: sem compromisso sério com o planejamento.
 
A história de uma cidade desestruturada se repete ao longo destes 50 anos! Conta a autora acima citada, que documentos do Plano de Doxiades foram encontrados perdidos num canto do Palácio da Guanabara! Nunca foi aplicado, nem ele, nem os anteriores, e parece que nem o atual.
 
A gaveta parece ser o triste destino do planejamento da Cidade, ao menos até agora. Mas as organizações sociais e, sobretudo, as Associações de Moradores começam a reagir. Afinal, parece que somente isso trará resultados concretos.
 

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Theatro Municipal novo em folha

O Theatro Municipal é um dos esplendores da cidade do Rio de Janeiro. 

Confira nesta apresentação, publicada ano passado, um pouco do processo de restauração e a suntuosidade da arquitetura de um ícone da Cidade Maravilhosa.


quinta-feira, 14 de julho de 2011

Quem multará?

Novas leis municipais disciplinam a civilidade no Rio. Mas quem multará os infratores?

Dia chuvoso em hora de estio. Embora sem nenhuma pressa, o homem seguia determinado pela calçada balançando um guarda-chuva preto, tão alto e esguio quanto ele, que gingava para frente e para trás em ritmo preciso de um pêndulo de relógio de parede.

Quem quer que passasse distraído nas imediações do deslocamento do homem levaria uma lambada das boas com direito a escoriações e, dependendo da proximidade de sua zona de ação, seria premiado com um ferimento mais grave.

O perigo desfilava pela calçada, à vista de todos, e provavelmente atemorizando muitos, mas, por perto, não havia ninguém para interromper o perigo iminente e ambulante e, muito menos, para multá-lo e encaminhá-lo a uma suposta autoridade competente.

O fato relatado acima aconteceu há uma semana em plena Cinelândia. Ninguém se pronunciou ou abordou o homem comprido e, pior, ninguém ameaçou multá-lo. Ou melhor, haveria alguém por perto investido da autoridade para multá-lo? A guarda municipal?

O mesmo podemos nos perguntar a respeito de situações por demais semelhantes, que se repetem milhares de vezes por dia em todos os lugares do planeta. Mas fiquemos no Rio de Janeiro, pois só ele, se não dispõe de quem multe atos semelhantes, pelos menos dispõe de leis que os pune.


Você sabia que no Rio de Janeiro existe uma novíssima lei municipal que obriga que nos elevadores, nos vagões de metrô, nos ônibus, nos prédios comerciais e de serviços e de uso misto, nas edificações dos poderes públicos, nas lojas de departamentos e nos shopping centers, deverão ser afixados cartazes informativos sobre a maneira correta de se carregar uma mochila? É a lei nº 5292/2011. (Confira)

A curiosidade é a de saber quem multará o infrator. Sim, porque não há norma sem sanção. E para aplicar a pena de multa é necessário que haja fiscal com atribuição para aplicá-la. E se o infrator não pagar, impõe-se que seja cobrada judicialmente.

Também foi recém aprovada na Câmara Municipal a lei nº 5393/2011 que proíbe o uso de celulares nos postos de gasolina, com previsão de multa para o infrator.(Confira)

Tudo isto para que a norma de civilidade não fique no vácuo, ou seja, ela existe, mas não é aplicada por ninguém. E, se descumprida, nada acontece.

Justiça seja feita: as leis municipais nºs 5292/2011 e 5293/2011 bem que tentam coibir, respectivamente, o uso das mochilas nas costas em lugares públicos onde há muito vaivém de pessoas e o uso do celular em postos de gasolina, atitudes que não primam pela civilidade e pela urbanidade, além de serem potencialmente causadoras de acidentes.

Agora, além da iniciativa da Câmara transformando em lei normas de urbanidade, a fiscalização é o busílis, ou seja, a dificuldade da questão. E ela cabe ao Executivo, na sua função básica de dotar a administração pública de condições básicas na prestação de serviços de fiscalização das normas municipais de civilidade e bem estar na cidade. Infelizmente, ainda estamos bem longe disto.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Habitação social como prioridade a ser garantida


Prover habitação de interesse social é hoje um ponto central na administração das cidades. E, para a população de baixa e média rendas, cabe ao Poder Público fazer com que, por meio do planejamento urbano, ela seja assegurada pelo mercado. Se não for, é função do governo suprir este vácuo. As leis fazem parte deste processo público.

Por isto, ontem (12/7), o "Diário Oficial" do Legislativo Municipal publicou o projeto de Lei 1047/2011, de minha autoria, propondo que, na Área de Planejamento – AP1 da zona portuária do Rio de Janeiro, seja reservado à habitação de interesse social um percentual mínimo de 10% das receitas arrecadadas pela venda dos CEPACs, bem como 10% da área para o mesmo fim. Confira o projeto. (clique aqui)

A área portuária é onde se desenvolve o projeto do Porto do Rio, capitaneado pela Prefeitura do Rio, que lá desenvolve uma chamada “Operação Urbana”. Este projeto, para ser de vanguarda e realmente maravilhoso, teria que prever áreas para habitação de interesse social.

Como ainda não o fez – e já se começam a divulgar outros projetos de grande magnitude (Vila Olímpica, Mila de Mídia, superprédio acima da rodoviária), que tendem a induzir para o alto o valor de acesso à terra – a reserva de área para habitação social se impõe. Caso contrário, tudo acabará como sempre: a concentração das áreas mais nobres e centrais nas mãos dos que detêm mais renda.

A expulsão, pela remoção da população que lá vive, já começou. Mas as reuniões que lá se realizam, visando a proteção de suas moradias, não passarão de tentativas de enxugar gelo enquanto o compromisso pela habitação social não estiver explicitamente inserido no projeto do PORTO DO RIO. Ainda não está. Nem uma palavra foi dita sobre isto no projeto vencedor do concurso do IAB-RJ. Tudo é suposição e discurso. 

Caso a intenção de se assegurar minimamente área e recursos para habitação social seja verdade, o Governo Municipal não só não obstará o andamento do nosso projeto, como também dará apoio a ele, aumentando o percentual para este fim.
O mesmo se espera da Caixa Econômica Federal, hoje detentora da totalidade do potencial construtivo da região. Afinal, a Caixa é ou não é um banco social?

terça-feira, 12 de julho de 2011

Água provoca enxurradas de projetos de lei

Uma nota publicada no caderno "Morar Bem" do jornal "O Globo", de 9 de julho, anuncia a aprovação, em primeira votação pela Câmara Municipal, do projeto de lei que determina a instalação de dispositivos de captação de águas de chuva em todos os imóveis residenciais com mais de cem unidades, até 2011; e comerciais e públicos com mais de mil metros quadrados, até 2013.

A notícia nos causou estranheza e, como legisladores, resolvemos pesquisar e verificar a exatidão da notícia. Constatamos, então, que o Projeto de Lei 166/2009, que criava o programa de conservação e uso racional da água, foi aprovado em 2011, resultando na Lei 5279/2011. Confira

Contudo, o projeto mencionado pelo jornal "O Globo", que é o 59/2011, ainda não foi votado e está dependendo do parecer de seis comissões. Confira

Tendo em vista a importância do tema – leia-se, a gestão da água - , parece que cada vereador quis, ou quer propor um projeto sobre ele. Ficam, então, duas perguntas a serem respondidas após longa reflexão:

Será que a Câmara Municipal está tecnicamente capacitada para dispor sobre o tema? Ou tais projetos deveriam constituir apenas leis autorizativas, dentre as inúmeras que têm sido aprovadas?

Fato é que, o primeiro projeto aprovado, a lei 5279/2011, embora tenha sido vetada pelo Executivo, seu veto foi rejeitado pelo Legislativo que promulgou a lei - ou seja, colocou-a em vigor.

Salvo se for declarada inconstitucional pela Justiça, e para isto é preciso que a Procuradoria do Município inicie um processo judicial com este fim, ela já pode ser aplicada. Portanto é a ela que se deve dar publicidade e conhecimento aos cariocas.

A lei permite, em seu artigo 7º, a captação e uso da água de chuva pelas edificações para algumas funções. Com isto, afasta, ao menos a nível municipal, qualquer ingerência da CEDAE obstaculizando este aproveitamento. E isto é bom.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

O TEMPO E O VENTO: denúncias e o modelo institucional brasileiro


O que fazer?  Marina Silva, que parece intuir o tempo, e repetir que "nada mais forte do que uma ideia cujo tempo chegou", propõe uma "nova forma de fazer política", no recém inaugurado Movimento da Cidadania.

Notícias sobre a corrupção na prática governamental chegam a novo clímax. De repente publica-se o que todos já sabíamos? Tudo articulado nos corredores, e a população assiste a tudo perplexa, revoltada, mas sem saber o que fazer.

Os órgãos de controle Tribunal de Contas da União (TCU), Ministério Público Federal (MPF), sobretudo, denunciam. Mas por que as denúncias não vão para frente?

Conta-se com o TEMPO, que transformará tudo em VENTO. Daqui a uma semana, novas manchetes, novos fatos, e tudo se apagará da memória. Conta-se com isto para que a impunidade continue a grassar, e tudo continue como dantes.

Na fundação do Movimento de Cidadania, por Marina Silva na quinta-feira, 7 de julho de 2011 em São Paulo, esta cidadã brasileira que traz a esperança de uma nova forma de se fazer política, propõe “sensibilizar os brasileiros, ainda meros espectadores, para transformarem-se em força mobilizadora, para que este Brasil, o Brasil que está de `fora´ desta política hoje praticada, e disseminada, reaja”. Este é o único caminho para transformação, do mundo, através de si   mesmo....

Para isto é necessário conhecer os fatos, saber como se relacionam com o sistema institucional que os mantém... Saber responder:

1. Por que o prefeito de Teresópolis, denunciado por desviar recursos públicos de calamidade pública ainda continua no exercício das funções de prefeito. Por que não foi afastado? Por que não se pede a intervenção estadual no Município, cujos habitantes continuam sem hospitais, sem auxílio, sem governo?

2. Por que os denunciados por corrupção de obras superfaturadas não são presos?

3. Por que não há concurso para os cargos de Ministros e Conselheiros dos Tribunais de Contas da União e dos Estados?

4. Por que existe dificuldade processual de se apurar faltas administrativas resultantes de improbidade administrativa?

É o sistema institucional que não está preparado para processar e punir o que a sociedade deseja. Portanto, há mudanças que se impõem. Mas não é necessário somente saber o que não se quer, mas também é preciso saber o que se quer, e como fazê-lo. E para fazê-lo é necessário organização, e engajamento político, ainda que seja suprapartidário.

É pensando em colaborar com este processo de renovação política, nesta “nova forma de fazer política”, que este blog noticia os fatos, faz os seus comentários, e insiste em pontos que entende fundamentais para que o modelo institucional brasileiro sirva aos brasileiros, e não aos políticos que dele se servem.

Fatos, comentários quanto ao modelo e funcionamento institucional e jurídico do serviço público, e da política legislativa serão, daqui por diante, nossa linha de informação e divulgação.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Marina Silva desfilia-se, mas não deixa os Verdes



A desfiliação de Marina Silva do PV será uma perda partidária, mas não de liderança no Partido. Muitos parlamentares que têm mandato na legenda devem prosseguir dentro da legenda, seguindo sua liderança de propósito e de linha de ação.

Nada os impede disto. Ao contrário, a pluralidade de pensamento, base da democracia, os impele a continuar essa luta dentro da legenda.

Marina Silva deixa formalmente o partido e inicia uma trajetória independente, liderando um movimento social para desenvolver e agregar mais pessoas a esse processo em que a nova cidadania está, inexoravelmente, vinculada à sustentabilidade e à solidariedade no espaço social e na convivência, no território rural e urbano.

Para isto, contará com muitos de seus correligionários do PV, a eles reunindo os cidadãos que seguem sua liderança também fora da legenda. O movimento social crescerá mais e agregará força à sua base política.

A saída de Marina Silva esteve relacionada à falta de espaço reivindicado, que lhe foi recusado pelas hostes burocráticas do Partido. Contrariamente ao que dispõe o estatuto partidário, não se cumpriu o estabelecido para as convocações democráticas de praxe de convenções, tanto em nível nacional como nos estados e municípios. A consequência foi lamentável para a legenda.

Porém, ao dessentir da atual direção partidária, não há negação nem dos seus liderados, muito menos dos princípios substantivos do Partido. Por isso, as portas estarão sempre abertas, já que o compromisso básico da solidariedade sustentável permanece íntegro por aqueles que, dentro ou fora do PV, comungam deste princípio.

Fica, então, patente que se trata de um movimento suprapartidário em que os corações verdes continuam, em uníssono, a bater e se bater pela cidadania, pela sustentabilidade e pela justiça.





quinta-feira, 7 de julho de 2011

Cidade como obra de arte...

Cidade como obra de arte seria um reposicionamento do título do livro de Giulio Carlo Argan (História da Arte como História da Cidade), historiador da arte que concebe a construção das cidades como arte e história: a cidade como construção coletiva, inserida na história, e fruto da cultura temporal.

Nossas cidades são frutos dos valores culturais do momento, das pressões de interesses, do conhecimento visto ou omitido. Mas sua mega dimensão nos dias de hoje não dispensa o planejamento responsável para sua sobrevivência como bem coletivo – mais, muito mais do que no passado.

Planejar é preciso. Planejar significa antever o futuro, em todas as suas dimensões.

O filme abaixo é uma fantástica lição de como prevenir. Ele nos mostra a relação entre o crescimento da cidade de São Paulo e os rios: Tietê, Tamanduateí, e outros que deram os rumos, as balizas, e o sentido urbano daquela cidade, mas que, depois, foram desprezados, enterrados e consumidos pelo planejamento rodoviarista que tomou conta do urbanismo paulistano.

A consequência disso, no entanto, não foi enterrada para sempre. Ela emerge concretamente, de tempos em tempos, à superfície daquela metrópole, nas enchentes – caro preço da imprevidência, do açodamento e da ganância.

Será que, no Rio, estamos cometendo ainda os mesmos erros?


Agradecimentos pelo envio a Harley Silva

PS: Carlos Santana, o produtor da animação de sucesso nos cinemas - RIO, declarou ontem em entrevista na TV que demorou três anos, junto com a sua equipe, planejando e construindo os 90 minutos daquele filme. Em quanto tempo se estuda e se decide sobre o planejamento viário da Cidade do Rio de Janeiro?  Aliás, há plano?