quinta-feira, 11 de novembro de 2010

MORADIA OU PROPRIEDADE? O caso da Vila Taboinhas

Recente decisão judicial no Rio de Janeiro reacende a discussão sobre remoção de moradores e direito de propriedade.


1.  A juíza E. B. de Castro deferiu, na última semana, liminar para que a empresa Debret S/A Construção Empreendimentos se reintegrasse na posse do terreno de sua propriedade na Vila Taboinhas, em Vargem Grande, na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro. O terreno de 40 mil metros quadrados, segundo noticiado, começou a ser ocupado em 2007 por dezenas de famílias.

2.  A empresa ajuizou ação de reintegração naquele mesmo ano. Porém, somente agora, obteve a liminar. As famílias que, na época, resumiam-se a algumas dezenas, atualmente, são centenas. A reintegração solicitada transformou-se em batalha social...

3.  A magistrada fundamentou sua decisão não só no pedido da empresa, mas também no “iminente o interesse público quanto à desocupação do imóvel, pois o mesmo encontra-se em área de proteção ambiental”, reconhecendo o periculum in mora quanto a não desocupação, implicando em “danos irreparáveis não só aos autores (a empresa), bem como ao próprio meio ambiente local, o que não pode ser tolerado pelo Juízo, razão pela qual impõe-se o deferimento da liminar”.
4.  O conflito de interesses, todos legítimos, está formado:
  • A empresa tem legítimo direito à sua propriedade.
  • Os ocupantes, sendo de baixa renda, têm legítimo direito ao acesso à    moradia, que não é sinônimo de propriedade.
  • A sociedade tem legítimo direito à preservação ambiental das áreas protegida. 
5.  E então, quem falhou?
  • Falhou o poder público municipal por não prever, em seu planejamento urbano, áreas para a ocupação de moradias de interesse social.
  • Falhou o poder público municipal em permitir que propriedade urbana tão vasta ficasse desocupada, sem função social, por tantos anos, a despeito da urgente necessidade de terras para moradia social.  Poderia ter usado os instrumentos urbanísticos disponíveis no Estatuto da Cidade, e na legislação vigente.
6.  Os conflitos privados versus privados e públicos versus privados continuarão a existir, enquanto houver o enorme déficit de planejamento urbano, voltado para gerar áreas para moradia de baixa renda.

E para tentar suprir o seu déficit de planejamento, o poder público municipal responde com o minguado e insuficiente paliativo do aluguel social...

Em tempo: Vargem Grande é o bairro para onde a Prefeitura do Rio aprovou, no começo deste ano, a lei que aumentou os gabaritos de terras privadas, hipervalorizando os terrenos particulares, sem qualquer previsão de recuperação dessa mais valia a eles dada, gratuitamente!

Veja a decisão judicial na íntegra.


FUNDAMENTAÇÃO:

Processo nº: 0005152-38.2007.8.19.0209 (2007.209.004902-1)

Tipo do Movimento: Decisão

Descrição: JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DA BARRA DA TIJUCA COMARCA DA CAPITAL Processo nº: 2007.209.004902-1

Ação: Reintegração de posse

Requerente: Ângela Maria Carneiro da Cunha Lessa Advogado: Dr. Vladimir Augusto Magalhães Macedo - OAB/RJ87024 Representante Legal: Bernardo Lesbaupin Requerente: Sabino Machado Barroso Requerente: Marília Cintra Macedo Barroso Requerente: Cláudio Luiz Coelho Pinheiro Requerente: Marília Pedroso torres bandeira Requerente: Jayme Zettel Requerente: Maria Magdalena de Lacerda Bicalho Requerente: Roberto Gentil Requerente: Márcia Castro de Lacerda Teixeira Requerente: Roberto Miguel dos Bastos Cruz Requerente: Eduardo Bruno Requerente: Sueli Maria Salgueiro Bruno Requerente: Sylvia Marsicano Requerente: Debret S/A Construção e Empreendimentos Réu: Rosângela Ramos da Silva Advogado: Dr. Cláudia da Silva Gomes - OAB/RJ88153

AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO Aos 31 dias de março de 2008, na sala de audiências deste Juízo, às 16:11 horas, presente a MM. Juíza de Direito da 1ª Vara Cível Regional da Barra da Tijuca, Comarca da Capital, Dra. ERICA BATISTA DE CASTRO, foi aberta a audiência designada.

Ao pregão respondeu a Ré - Rosângela, acompanhada de seu patrono. Ausentes os Autores. Pela Ré foi dito que não ocupa o imóvel objeto da inicial, conforme comprovante de residência que ora junta em audiência. Em seguida, pela MM. Juíza foi proferida a seguinte decisão: ´

Trata-se de ação de reintegração de posse ajuizada pelos Autores em face da Ré - Rosângela e eventuais ocupantes do imóvel, não identificados, com pedido de liminar, sustentando que os Réus vêm praticando esbulho possessório sobre o imóvel denominado Lote 01, PA 31.680, matriculado no registro de imóveis sob o nº 79.815, localizado na Estrada dos Bandeirantes, posto que impedem o acesso dos Autores ao imóvel. No caso vertente, apesar do não comparecimento dos autores, da narrativa constante da inicial, constata-se que presentes os requisitos necessários para o deferimento da medida liminar. Não há dúvidas que os autores são os legítimos proprietários e possuidores do imóvel objeto da inicial, conforme se observa dos documentos acostados aos autos, estando presente o fumus boni iuris. Também presente o requisito do periculum in mora, posto que os ocupantes do imóvel, de forma clandestina, adentraram naquele há menos de um ano e dia, conforme documento de fls. 33. Como se não bastasse, iminente o interesse público quanto à desocupação do imóvel, pois o mesmo encontra-se em área de proteção ambiental, tanto que a própria Prefeitura do Rio de Janeiro registrou ocorrência quanto à invasão clandestina no imóvel em 16/04/2007. Portanto, os Autores foram esbulhados em sua posse, sendo que a não reintegração de posse irá gerar danos irreparáveis não só aos Autores, bem como bem como ao próprio meio ambiente local, o que não pode ser tolerado pelo Juízo, razão pela qual impõe-se o deferimento da liminar. Pelo exposto, DEFIRO A LIMINAR DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE requerida pelos Autores, determinando a reintegração de posse dos Autores sobre o imóvel localizado na Estrada dos Bandeirantes, contíguo à Comunidade Vila Taboinha, denominado Lote 01, do PAL 31680. Considerando as peculiaridades do caso concreto e número de ocupantes do imóvel, aproximadamente 400 (quatrocentas) famílias, intimem-se os ocupantes para desocupar o imóvel, no prazo de 48 horas, devendo retirar todos os seus pertences do local, sendo que findo este prazo, os oficiais de justiça promoverão a correspondente reintegração de posse do imóvel. Para isso, devem os oficiais de justiça cientificar todos os ocupantes, mediante afixação desta decisão na associação de moradores local e distribuição de cópias para cada residência. Desde já, não havendo a desocupação voluntária do imóvel, fica autorizada a utilização de auxílio policial pelo oficial de justiça para que promova o adequado cumprimento da medida liminar, devendo, ser for o caso, manter contato direto com o Batalhão da Polícia Militar da área. Intimem-se as partes do teor desta decisão, cientificada a Ré - Rosângela que o prazo para contestar a presente ação iniciar-se-á a partir desta data.´ Nada mais ocorrendo foi a audiência encerrada às 16:25 horas, e, para constar, lavrou-se o presente. 

Um comentário:

Planetativo disse...

Realmente a falha do poder publico é inegável, mas diante do problema de moradia os proprietários têm também que se precaver.

O proprietário tem que fazer os investimentos necessários para a real proteção da sua propriedade.