1. A expressão inglesa “Due process of law” é bastante conhecida tanto nos meios jurídicos, como fora deles, além de ser comumente traduzida como “devido processo legal”. E, “devido processo legal” é comumente compreendido como direito a um processo, a um procedimento de julgamento.
2. Contudo, sua história é muito mais rica do que isto. Talvez sua tradução mais correta seja “devido processo do Direito, ou ao Direito”. Vejamos:
3. Suas origens remontam ao direito inglês, à Carta Magna (1215). Dá para imaginar o que era a vida naquela época, e o totalitarismo real e da nobreza ? Eles ditavam a lei. Eles eram a lei. Por isto, a grande conquista da humanidade foi a do chamado "Estado de Direito". Ou seja, a de que a sociedade predetermina o direito a ser cumprido por todos. A cláusula do “due process of law” veio garantir, desde então, que ninguém poderia ser preso, acusado ou condenado “sem um julgamento, e pelas leis da terra”. Mais tarde, em 1628, a Petição de Direitos (Petition of Rights) reafirmou esta regra, que atravessou séculos até nossos dias.
4. Due process of law, portanto, resume o que chamamos de Estado de Direito. E, Estado de Direito é, simplesmente, o conjunto de regras estabelecidas previamente, e que todos devem cumprir. É a “lei da terra” (law of the land), que nos garante não sermos julgados pelo "arbítrio do Rei", seja ele que nome tenha.
5. O Estado de Direito estabelece regras para nosso comportamento público e privado, em função de interesses sociais, políticos e coletivos. Sua observância, e a punição pelo seu descumprimento garantem a percepção de que a regra vale para todos, e assim procura-se garantir a paz social.
6. Todos estes aspectos aparentemente teóricos da construção do sistema jurídico estão presentes diuturnamente em nossas vidas. E hoje, o mais revoltante talvez seja a percepção de que quem cumpre a lei , seja rico ou pobre, é um tolo que não percebe que o "Estado de Direito" pode ser apenas uma falácia, pois o que vale mesmo, como regra, é o poder e o comando, arbitrário, dos recursos e do dinheiro público continuamente privatizado, em sua várias formas.
7. A ocupação de terras públicas, no Jardim Botânico perfaz esta hipótese. Invasão ou não, a ocupação é ilícita, contra a lei. O estado de necessidade (moradia) de indivíduos que estão lá pode ser suprida de outras formas, e não justifica que se diga para todos os demais, também donos daquele espaço público, que eles perderão o seu direito coletivo para aqueles que ousaram descumprir a lei, ainda que justificado por um eventual estado de necessidade! E pior; que estes passaram a ter, pela ousadia do ilícito, a conquista de um direito individual de propriedade!
Definitivamente, seria o enterro da regra do “devido processo do Direito”!
8. No plano do convívio social, a justiça somente pode ser construída pela consciência de que, antes de tudo, a observância, por todos, da “lei da terra” é a garantia básica do Estado de Direito. Sem exceções!
(Consulte mais sobre o assunto em Constitutional Law and Politics - David M.O´Brien)
8 comentários:
ué, e a usucapião? há pessoas que estão lá há décadas.
Leo,
a usucapiâo é uma lei que permite que terras PRIVADAS, em desuso, sejam apropriadas por outras pessoas (privadas).
Não é o caso do Jardim Botânico. Além disto, e o mais importante, é que a Constituição Federal proibe a usucapião de terras públicas, há mais de um século!
Não existe usucapião para terras publicas. Senão imagine quantos donos teria a amazonia.
Tudo ótimo, não existe usocapião mas e as pessoas que lá moram? Vão ficar "ao Deus dará" depois de mais de meio século de moradia? Será que alguém acharia justo ser "removido" para algum lugar da baixada fluminense com toda sua rotina voltada pra a zona sul? filhos, amigos, trabalho... tudo por água abaixo. Acredito que a maioria das pessoas que aqui reclamam tiveram uma vida muito tranquila nos seus quartos com ar-condicionado, bem diferente da vida dos que precisam morar "de favor" da união. Espero que compreendam que morar no Horto é uma necessidade.
Moradia é um direito de todos. Não só dos que estão lá. Para isto é preciso políticas públicas consistentes e eficazes para sua produção. O Estado, a pretexto de regularizar aqui e ali não tem assumido o ônus de colocar o dedo na ferida, como temos publicado aqui.
No caso do Jardim Botânico, o patrimônio é de todos os brasileiros, inclusive dos outros milhares de pobres que não souberam que podiam ocupar o local para ter futuro "direito" à moradia.
Como dizia Stanislau Ponte Preta, "ou se instaura a moralidade, ou locupletemo-nos todos".
Alguém poderia me dizer, do ponto de vista de ocupação irregular de terra pública, qual a diferença entre o Jardim Botânico e as encostas existentes na cidade do Rio de Janeiro (Rocinha, Pavão Pavãozinho, Vidigal, etc.)?
Dentre em breve, teremos um super bairro classe AA onde atualmente é o Vidigal (que vista magnífica!). É pagar para ver.
Sugiro aos que estão querendo entender de fato esta questão visitem o site:
http://www.amajb.org.br/2011/08/corra-defenda-o-jardim-botanico-do-rio-de-janeiro
Talvez os senhores entendam melhor esta questão.
Leiam em http://www.sosjardimbotanico.com.br
Há várias matérias explicando como surgiu a o litígio.
Existe uma grande diferença entre as ocupações das comunidades da Rocinha e outras para as casas construídas inicialmente para uso de antigos funcionários do Jardim Botânico. Hoje pelo que é dito existem poucas (das 600 moradias talvez 100?)
Podemos perder um importante centro de Pesquisa e o título de patrimônio da Humanidade
Sugiro verem também:
Título ameaçado: "A favelização de pontos turísticos põe em risco a candidatura do Rio a patrimônio mundial da humanidade"
http://vejario.abril.com.br//edicao-da-semana/rio-patrimonio-humanidade-637970.shtml
Rachel
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Existe uma grande diferença entre as ocupações das comunidades da Rocinha e outras para as casas construídas inicialmente para uso de antigos funcionários do Jardim Botânico. Hoje pelo que é dito existem poucas (das 600 moradias talvez 100?)
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Rachel
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