quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Serviços públicos e funcionalismo: manda quem pode?


E, afinal, quem manda nos vida do funcionalismo público, que presta os serviços públicos à população?

É o chefe do Executivo, federal, estadual e municipal.

Há uma unanimidade nas pesquisas de opinião sobre a absoluta necessidade de investimentos e melhorias nos serviços públicos de educação, saúde, segurança pública, planejamento urbano e social da cidade com transportes públicos, habitação social, infraestrutura sanitária, de lazer, tudo com qualidade de vida e sem poluição.

Mas como implementar isto tudo sem serviços públicos que funcionem? E como implementar serviços públicos que funcionem sem funcionários públicos eficientes?

E como ter funcionários públicos eficientes – e que dêem conta do serviço público a médio e longo prazo, para além de prazos políticos – sem que recebam remuneração adequada, com reajustes que acompanhem a inflação, e com segurança, clareza e independência de suas atribuições funcionais, plano de carreira, responsabilidades e controle de seu desempenho ?

Remuneração dos funcionários nas mãos do chefe do Poder Executivo!

Pois então: a fixação da remuneração dos funcionários, os seus reajustes (mesmo aqueles que recomponham as perdas inflacionárias), a existência e adequabilidade dos seus planos de carreira, a fixação e o controle de suas responsabilidades – tudo isto está atrelado à vontade suprema e exclusiva de um único personagem: o chefe do executivo do momento!

Se ele quiser, ou não quiser, prestigiar uma ou outra categoria, negociar a “obediência” em troca de encaminhamentos, colocar de “castigo” determinadas reivindicações, tudo é possível, no atual sistema constitucional que regula o assunto.

Nossa Constituição Federal – no intuito de tudo regrar e disciplinar, para tudo controlar e garantir – resolveu dedicar mais de 20 artigos de seu texto ao funcionalismo público.

E, o mais perverso é que, no âmbito do Poder Executivo, colocou tudo nas mãos exclusivas do seu chefe – o presidente, o governador e o prefeito –, que detém a iniciativa privativa sobre qualquer projeto de lei que diga respeito ao funcionalismo público sob seu comando.

E, como tudo depende de projeto de lei – padrões de remuneração, direitos e deveres, formas de controle, aumentos, reajustes, planos de carreira, direitos previdenciários –, tudo acaba dependendo de uma complexa negociação política com o chefe do executivo do momento.


As consequências são dramáticas: meses de greve por melhoria de remuneração dos professores, médicos, bombeiros, polícia, e até de funcionários com a mais alta remuneração, como fiscais, juízes, policiais federais, que têm, mais do que quaisquer outras categorias, enorme poder de pressão.

No Estado do Rio, recentemente, vimos o episódio dos bombeiros que, apesar da repercussão na imprensa, teve, relativamente, pequenos resultados financeiros.

Professores de segundo grau do Estado do Rio estiveram em greve por dois meses, sem qualquer impacto ou reação relevante por parte da população em geral, ou da imprensa. Idem no Estado de Minas Gerais, e em muitos estados da Federação.

Vidas dos funcionários públicos reféns das negociações políticas

E daí? Daí que os chefes do executivo sabem que, em função do art.61 da Constituição Federal, eles tem “a faca e o queijo na mão”. É só esperar, e tudo vai se desvanecendo, já que, nos movimentos reivindicatórios dos funcionários, é difícil haver solidariedade (nunca vi funcionários de um setor mais privilegiado aderir à greve por outro setor menos privilegiado, e paralisar tudo!).

Paralisar por que, e para quê?

Para sentar e conversar, com real intuito de repartir melhor o bolo destinado aos funcionários públicos e, com isto, um melhor funcionamento dos serviços públicos como um todo, a médio a e longo prazos.

Garantir reposições inflacionárias dos padrões de remuneração, planos de carreira adequados, segurança previdenciária, questões essas básicas e elementares à organização da vida daqueles que se dedicam, por décadas, à prestação dos serviços públicos à população, independentemente do chefe do executivo do momento.

Ao menos, no âmbito da iniciativa privada, há o recurso dos acordos e dissídios coletivos, para os quais a Justiça do Trabalho é chamada, como neutra, a intermediar a conversa.

Os funcionários públicos carecem deste árbitro. Eles só dependem, em quase tudo do chefe do executivo e dos parlamentares, que também decidem, politicamente, o que fazer com os funcionários públicos e, consequentemente, com os serviços públicos.

Nada a estranhar, já que agir politicamente é parte essencial dos papéis institucionais do chefe do executivo e dos parlamentares!

E é assim, com essa organização institucional em vigor, que a vida e o futuro dos funcionários públicos e serviços essenciais prestados a toda população continuam reféns das negociações políticas, dos seus favores e humores do momento de seus personagens. Infelizmente, é este o modelo institucional padronizado pela Constituição.

Por isso, esta questão institucional precisa ser objeto de uma discussão social mais ampla, pelo bem da continuidade e da qualidade dos serviços públicos prestados pelo Estado – sua razão de ser !

Um comentário:

Sergius disse...

Doutora Sonia Rabello,
Concordo que os chefes do poder executivo deveriam exercer suas funções em harmonia com os outros dois poderes, mas nunca EM FUNÇÃO DESTES.
Esse é o grande mal trazido pela Constituição de 1988 e que causou a invasão de políticos no poder executivo, exclusivamente como ampliação de seus poderes e maior arrecadação para o partido a que pertencem.
Vide o descalabro que acontece na PTrobras e VALE, que promovem evasão de direitos, divisas e riquezas minerais, em troca de gordas propinas.
A ANP já foi intitulada, com muita justiça, Agência Nacional da Propina.
A VALE tem compromissos eternos com a China, para fornecimento de minério de ferro em escalas absurdas, sem contar com a grande ajuda do homem, que através de seu pai, tornou-se mais poderoso ao aliar-se ao governo, inclusive com força suficiente para mudar os rumos da ainda estatal VALE, com a demissão de Agnelli, por interesses de contratos de suas empresas mineradoras com os chineses.
Apenas estar onde está o dinheiro público é o mote dos políticos que vendem o país em troca de 30 dinheiros, enquanto empobrecemos a olhos vistos.
Admito, portanto, a liderança do presidente, governador ou prefeito sobre o executivo, mas esse, obrigatoriamente, deveria se desvencilhar do jugo político e seguir normas rígidas de procedimento indicadas pelo Ministério da Administração Pública, como proposto e instituído por Bresser Pereira em 1995 e abandonado em dois anos.
Não há como estabelecer estrutura funcional sem um evoluído padrão de conceitos de Recursos Humanos, assim como estes conceitos nunca existirão sem interesse do governo em dar corpo e voz à administração pública.
Enquanto estivermos nas mãos do POLITBÜRO stalinista estabelecido no país, continuaremos a presenciar o que sempre vimos nas instituições federais, estaduais e municipais: GREVE DE FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS POR ESMOLAS E TOTAL INEFICIÊNCIA DOS SERVIDORES.
Em administração todos sabem que a galinha vem sempre antes do ovo. Logo, a galinha deve cacarejar e botar o ovo da administração urgentemente.