terça-feira, 12 de junho de 2012

Perimetral: alternativas à demolição

A demolição do viaduto da Avenida Perimetral, no Rio de Janeiro, foi objeto de debate, ontem na Sociedade dos Engenheiros e Arquitetos do Estado do Rio de Janeiro (SEAERJ).  Pela primeira vez, um tema de tal relevância foi objeto de uma discussão técnica.

A unanimidade das vozes lá presentes foi contra a a demolição dessa obra de engenharia viária de grande porte feita, há menos de cinquenta anos, com recursos públicos significativos.

Ficou certo que pontos de vista estéticos não justificam a demolição do viaduto da Perimetral, cujo papel é estruturante no sistema viário da cidade do Rio e de sua Região Metropolitana.

A demolição da Perimetral, que tem, repito, pouco menos de 50 anos, e que produzirá um enorme volume resíduos, será apenas para trocar quatro vias rodoviárias por duas outras, sem qualquer atenção ao transporte metroviário ou coletivo de massa.

No debate, foram apresentados estudos para melhoria da ambiência do atual viaduto da Perimetral, mas que se encontram desprezados. Também não estão sendo considerados estudos acadêmicos sobre o aproveitamento de suas estruturas para a implantação do transporte sobre trilhos.

Chegou-se a conclusão que ninguém conhece e nem teve acesso a qualquer projeto executivo da proposta de demolição da Perimetral, de como serão executadas as obras viárias, de quanto serão seus custos para a população ou de como será feita a proteção dos monumentos que circundam a área, a exemplo do altivo Mosteiro de São Bento (sofreria ele impactos e abalos?).

Assim, qualquer decisão de demolição da nossa Perimetral é, sem dúvida, açodada e autoritária, pois ainda não foi lhe dado nem respaldo técnico, nem social.

11 comentários:

Victor Mendes disse...

dra. sonia,
hoje mesmo passei pelo elevado e pude reparar as ferragens à mostra e a decadência que por lá se instalou. penso alto: será que é seguro circular por lá?
este elevado é um aborto da natureza e produz um impacto mais do que significante na ambiência do cais do porto.
a sua demolição é bem-vinda.
não há soluções mágicas para o rio de janeiro. a política econômica equivocada do presidente da república trouxe milhões de automóveis para as ruas... os transportes públicos sucateados... todos querem ter um automóvel e estacionamento na porta... omeletes são feitas quebrando-se os ovos. mas parece que ninguém quer saber deste ônus. todos querem somente o bônus da decisão, mas enfrentar as consequências de seus atos de maneira honesta e madura... nada!
pedágio, via expressa, fiscalização, rodízio, transporte alternativo marítimo... isto ninguém deseja... porque consideram tais soluções impopulares e não trarão votos para estes políticos que aí estão. preferem empurrar o problema com a barriga. aliás, todos têm a barriga enorme de tanto usá-la para empurrar o que lhes desagrada. coisa de pobre mesmo!

Sonia Rabello disse...

Caro Victor, pode ser, ou não. Mas, a questão é super polêmica, cara, complexa e, por isso mesmo, precisa ser discutida muito melhor, para que não cometamos mais erros... Onde está o plano viário da cidade? Por onde passará o metrô ali? Obrigada por seu comentário.

Almeida disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Almeida disse...

Concordo com o Victor. Acredito que a pobreza seja de perspectiva. Engana-se quem encara a Perimetral apenas como um problema visual, estético. O problema da perimetral tem caráter simbólico e cultural. O elevado, literalmente, passa por cima da memória, da história do Rio de Janeiro, estendendo-se de 1567, com a construção do remanescente Forte de S. Tiago, até os dias atuais. Isto implica decisivamente na ocultação e degradação de um corredor cultural que é a própria linha do tempo da cidade do Rio de Janeiro. A discussão não deve se pautar unicamente nos aspectos financeiros, no da comodidade de motoristas, tampouco nos estéticos, mas principalmente no sócio-cultural. O custo-benefício de 1,2 bilhão bem investidos na requalificação urbana e no resgate da identidade carioca certamente será muito maior que o de 40 milhões no embelezamento de um elevado. Melhorar a ambiência do elevado será apenas maquiagem a continuar ocultando, de outra forma, a já bela e esquecida face do Rio.

Maysa Blay disse...

Prezada Sônia,

Fora os comentaristas, não vejo nos seus argumentos, ou dos engenheiros do debate - eu estava lá - uma brecha para se permitir sonhar que podemos mudar. O Rio não é uma cidade vanguardista? Lançou tantos novidades culturais...pois querida Sonia, que admiro de muitas lutas, vamos levar á frente o sonho do Rio mostrar ao Brasil que podemos gradualmente abandonar a carro-mania nacional. Se não nos permitirmos pensar nesta possibilidade, insistindo em viadutos, túneis e outros escapes rápidos para carros, nem estas vias mais bastarão. Vamos mostrar ao Rio e ao Brasil que somos de vanguarda sim. Vamos re-valorizar nosso centro, e buscar diálogo com esta prefeitura - que concordo, não nos perguntou - e avaliar se queremos carros passando, ainda que por baixo, no centro. Hoje estive na palestra de Leonardo Boff, na Cúpula dos Povos. O mestre termimou sua sempre brilhante fala nos dizendo a todos: "a opção é mudar...ou mudar...". É isto Sônia. Abraços.

Weber Figueiredo disse...

Professora Sonia

Só se destrói obra pública que não presta, que está corroída.

O poder executivo não tem respaldo legal para demolir uma obra pública IMENSA, FIRME, SÓLIDA e MUITO ÚTIL, alegando questão altamente subjetiva (visual), sem que haja uma consulta à população. Por isso, cabe o questionado judicial.

A Perimetral nos custou muito, mas muito mesmo, tanto em dinheiro, pago por todos nós através dos impostos, quanto em engarrafamentos infernais que sofremos durante os anos de sua construção.

Demolir a Perimetral é semelhante a um ato de alta corrupção, pois haverá um imenso desperdício do dinheiro público investido.

O grande desafio é fazer a readequação da Perimetral, tornando-a bela e integrada harmoniosamente ao ambiente. Isso é coisa para gênios da arquitetura e artes. Demolir é coisa para trogloditas.

weber@globo.com

Lourdes Zunino disse...

Prezados comentaristas, na minha apresentação mostrei uma breve linha do tempo com propostas para o futuro, fundamentadas pela apresentação do Ricardo sobre a nova política de mobilidade urbana. Considero todas como requalificação urbana. Todas vão no sentido de mudar priorizando cidadãos e paisagem. Desde vestir a Av. Perimetral com tratamento estético e acústico enquanto não se tem transporte público de qualidade, até transformá-la em jardim para o transporte ativo, humano. Hoje acredito que a melhor solução seria requalificá-la como suporte para VLT, metrô de superfície, magleve ou outra tecnologia não poluente e de grande capacidade ligando nossos aeroportos, rodoviária, estação de trem, ampliando agora nossa capacidade de deslocamentos mais sustentáveis para o futuro. É uma questão de oportunidade.
A linha 3 de Niterói a Itaboraí está prometida até 2014. Mais um pouco de vontade política e ela atravessa a ponte! No evento do IAB que citei no debate, um participante falou de suas negociações com a prefeitura do Rio sobre tecnologia para transporte de carga em VLT. Aí sim muitos carros e caminhões deixariam de ser usados, nossa meta de redução de emissão de carbono seria rapidamente alcançada. Não precisaria de mergulhão...
O argumento que o investimento em BRT é o único possível para a verba e tempo disponível para atender aos eventos da Copa e Jogos Olímpicos, é a resposta que ouvimos das autoridades. Mas como é que Londres conseguiu ampliar sua rede de metrô e trens sediando os jogos desde ano por lá? Vontade política.
BRTs são certamente ótimos, que venham também, assim como ciclovias, vias compartilhadas, alimentando o sistema. E até vias expressas para carros individuais com motor a explosão, movidos a energia fóssil esgotável e poluente, que ainda vão fazer parte de nosso cotidiano por muitos anos até virarem peças de museu em futuro bem mais distante.
A questão é a ação civil para discutir com a população como vai ficar a poluição do ar no Porto Maravilha daqui a digamos 20 anos e qualidade de vida dos usuários.
Concordo que a Perimetral como está hoje é feia e sumir com coisas feias é ótima mudança. Mas transformar seu uso aparece como oportunidade além de mudança visando sustentabilidade.
O assunto é polemico, sobretudo quando acordos e investimentos já foram iniciados. Acabo de ler no jornal de hoje que um trecho da Perimetral começa a ser demolida em abril de 2013. O fluxo vai passar para o trecho que já estará pronto do binário. Em breve o engarrafamento vai estar a nível do solo. E Inês morta.
Lourdes Zunino

Almeida disse...

Enquanto o debate continuar a centrar-se no tripé custo financeiro, comodidade de motoristas e estética estará fadado a apegos, a paixões, ao que ME diz respeito enquanto indivíduo ou "grupo" e, portanto, à superficialidade. O que está em debate, ou deveria estar, não é o valor de competentes engenheiros e arquitetos brasileiros do passado e do presente, a qualidade técnica de um elevado, nem apenas o direito de motoristas trabalhadores irem e virem, mas a cidade, em toda sua abrangência social, cultural, histórica e simbólica, e seus cidadãos. É inquestionável a expertise do engenheiro Weber Figueiredo e sua inestimável contribuição para a engenharia nacional, e o mesmo pode-se dizer do valor da arquiteta Lourdes Zunino e de todos os pais da Perimetral. É verdadeiramente difícil, mas a questão não pode ser abordada com o doloroso apego do pai, que após muitos anos de dedicação e investimentos, ouve o filho dizer que é chegada a hora de seguir outro rumo, de levar consigo décadas de erros, acertos e aprendizados - e investimentos - para alcançar algo novo. Os pais da Perimetral, à época de sua construção, certamente foram esses filhos visionários, inovadores e de certo modo revolucionários que conceberam o elevado com o que havia de melhor em conceito, técnica e estrutura ao alcance do Brasil. Contudo, hoje outras alternativas se descortinam, convindo lembrar que a opção pelo túnel subterrâneo, já à época da concepção da Perimetral, fora considerada a primeira e ideal opção de via, não tendo sido implementada pela controvérsia "condições/garantias tecnológicas de engenharia da época" vs. "preservação do patrimônio". A evolução tecnólogia desde então foi enorme e intervenções bem sucedidas no 1o. e no 3o. mundos (Seul, Bogotá, Madri, Boston, Montreal etc.) nos servem de exemplo, o que, no entanto, não exime as autoridades de nos apresentar e discutir as garantias de tal empreendimento ainda hoje.

Almeida disse...

O argumento de que o Brasil é um país pobre, de que não tem capacidade de investimento em obra deste vulto é um equívoco ou demagogia política e eleitoreira. O Brasil caminha para ser a 5a. economia do mundo, com PIB e orçamento anual próximo de R$ 2,1 trilhões, mais dezenas de bilhões em crédito a fundo perdido dedicados especialmente ao Rio por BNDES, Caixa Econômica e, recentemente, Banco do Brasil. O argumento de que os R$ 1,2 bilhão da obra poderiam ser investidos em educação ou saúde é outro engano ou falácia. Esta quantia, derivada do investimento em CEPACs, só poderá ser usado para exploração do espaço abrangido pelo Porto Maravilha. Se lá não for investido, em nada ou em nenhuma outra área poderá ser investido. O uso do FGTS é polêmico, mas não é invenção nem privilégio dos "demolidores", do município do Rio ou do estado, nem implica em que trabalhadores não possam resgatá-lo quando necessitarem. É projeto discutível, embora já duas vezes votado e aprovado pelo Congresso e com aplicação em todo o território nacional.
A Coréia, como 15a. economia e com metade do nosso PIB, assim como a Colômbia, 28a., já investiram pesado em execuções conceitualmente semelhantes e preparam-se para colher os frutos de cidades para cidadãos (não apenas para admiradores, consumidores, turistas ou motoristas). O Brasil é um país trilhonário, com pessoas pobres, ignorantes e doentes, não por falta de dinheiro para investir, mas por falta de interesse ou competência das elites políticas, econômicas e intelectuais. Concordo que o custo financeiro da construção do elevado foi enorme - embora o custo econômico tenha sido tão grande ou tão pequeno quanto poderá ser o da demolição -, todavia o prejuízo histórico é de 445 anos, e o custo social e cultural é infinitamente maior, talvez incalculável. Alguns planejam demolir um elevado de grande valor estrutural e estruturante para uma época e que, por outro lado, é uma venda para uma cidade que não se enxerga e não se conhece; outros entretanto, demoliram o mercado municipal da Pça. XV, destruiram calçadas que nos conduziam ao nascimento e à trajetória da nossa cidade e da nossa sociedade; calçadas estas que hoje não existem ou têm o privilégio de 50 cm de solo às margens de muitos metros de pistas de rolamento, depósitos de lixo, urina e outros dejetos, abrigos de indigentes, esconderijos de assaltantes, estacionamentos de milicianos, refúgios de drogados e simples passagens. Destruíram mais que tudo isso: destruíram a identidade da cidade e do carioca, que há muito resume-se a praia, futebol e Carnaval.

Almeida disse...

Utilizar o elevado como jardim suspenso ou via de monotrilhos é certamente uma alternativa melhor que sua utilização por veículos automotivos. Contudo, por que optar por uma solução que continue a distanciar o carioca da sua cidade, a fazer do elevado um mirante nas alturas para uma cidade lá embaixo que permanece apenas uma bela paisagem a ser contemplada por passageiros, pedestres ou ciclistas, a fazer com que extenso centro histórico e pólo cultural, com tanto a ser vivenciado e usufruído, com necessidade de ser ocupado e percorrido, permaneça um espaço de passagem? Além do mais, o monotrilho não é apenas delgados trilhos e enormes e inúmeros pilares, mas uma sequência de estações as quais figuram como imensas caixas suspensas que não se coadunam com um centro histórico e seu patrimônio. Por que não legar ao carioca jardins sobre o chão hoje árido, que clama por verde e por gente? Por que não o VLT ou o nosso tradicional bondinho, sem pilares, com suas pequenas e discretas estações ao nível do solo, que aproximam o cidadão da cidade e do seu patrimônio cultural e o levam a percorrê-los dentro ou fora desses veículos? As expressões "custo" e "custo-benefício" vêm sendo mal empregadas no debate. Por que investir dezenas de milhões valorizando, requalificando o elevado, atribuindo-lhe valor artístico e paisagístico, se o que grita por recuperação e revaloração é o patrimônio artístico e arquitetônico que já está por fora e por dentro de museus e espaços culturais pouco conhecidos e frequentados no corredor que se estende da Bateria de São Tiago até pelo menos o Cais do Valongo? Por que investir em jóias para a Perimetral quando nossa maior riqueza permanecerá à sua sombra, embaixo e em torno do elevado?
Parece muito fardo pra um elevado, e é. Seria pouco ou quase nada não fossem mentes a fazer de uma obra repleta de acertos e erros o símbolo da falta de memória e da falta de perspectiva.

Sonia Rabello disse...

Todos os comentários acima mostram o quão polêmica é a questão. Fato é que é preciso ter planejamento para não termos perdurarmos em uma política de soluções por soluços. É preciso informação, debates, e participação. O tema merece. Vamos voltar a ele.